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domingo, 5 de agosto de 2012

Dona Felicidade


A Felicidade me entristece. Olhar em volta e ver que os casaizinhos riem, falam alto, abraçam-se, beijam-se, andam, passeiam, correm fitando o outro e rindo de dar gosto me deixa muito, muito triste mesmo. Não é inveja da alegria alheia não. Isso seria a mediocridade máxima. Até porque é bom que existam pessoas felizes ao seu redor. Isso diminui as chances de um amargurado qualquer sacar
uma pistola e sair disparando para todos os lados. O que me entristece é perceber que esses abençoados encontraram pelo caminho a Dona Felicidade e eu ainda sequer encontrei vestígios, fósseis, ou qualquer outra coisa que comprovasse a existência dessa mítica criatura! Enquanto isso, esses outros não se privam de mostrá-la ao mundo com generosos sorrisos e a aparência de que as outras Donas não existem mais (a Dona Tristeza, a Dona Solidão etc).

Por que ainda nem esbarrei nessa mulher? Parece que as ruas que percorro estão fora do mapa da lindinha. Nossos caminhos não se cruzam e acho que nem nossas rotas possuem o mesmo destino. Provável que ela jamais se aproximará de mim e tentará bater minha carteira. Muito provável que ela nunca demorará mais de três segundos olhando meus olhos se um dia resolver me encarar (isso se eu a encontrar). Certeza que ela nunca me perguntará a direção para algum lugar que somente eu sei o caminho. Bom seria andar pela rua e ser parado pela Dona em pessoa e ela, com um sorriso cativante e aquele jeitinho sempre jovial e lotado de esperanças e expectativas que indubitavelmente darão certo, viesse me perguntar “Por favor, onde fica a casa do Robson?”. Se isso é plausível? Não sei, vai que foi assim que aconteceu com todos os felizardos que vejo andando de mãos dadas com ela?

Outra possibilidade também levo muito em consideração: eu tê-la encontrado e a bendita tenha se apresentado com outro nome! Seria muito azar! Imaginem ter a oportunidade de olhar, conversar, alinhar inúmeros pensamentos com a Felicidade em pessoa e sequer desconfiar de que se trata da tão almejada e singular pessoa! Seria também cruel, da parte dela, omitir seu verdadeiro nome só para testar minha capacidade perceptiva emocional. Nessa disputa meu desempenho é pífio, patético e pedante. Não posso ser julgado pelo que me falta. Sempre ficaria devendo, em todos os quesitos. Então, se ela é imparcial, precisaria ser, no mínimo, sincera comigo. Afinal, tenho sentimentos! São tortos, instáveis, lastimáveis e tediosos, mas são válidos, pois até agora nunca me descredenciaram nos sorrisos sinceros que já emiti.

Só espero que ao encontrá-la, se isso acontecer, ela não seja uma felicidade sem graça, de piadas pobres e chata de se conversar. Precisa ser agradável no bate-papo, ter boa fluência nas ideias e argumentos. E não pode ter a mentalidade fútil que se alastra tão radicalmente entre as mulheres, provenientes desses romances de histórias bonitinhas de amor, com pessoas perfeitinhas e estúpidas. De nada adiante eu encontrar uma felicidade que se ache a última bolacha do pacote, que queira “causar” entre os homens e olhe direto nos meus olhos e diga quase que vomitando arrogância e prepotência: “se enxergue, baixinho esquisito, eu mereço o mundo, não esses minguados abraços”...

Aí eu desisto de tudo e me agarro de vez a quem eu já conheço muito bem: a Dona Solidão. Essa nunca me abandonará, eu sei, e preferirá a morte a me ferir tão ferozmente com clichês televisivos.