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quinta-feira, 25 de novembro de 2010

amoR X Amor

amoR: sentimento composto essencialmente pelos instintos mais primitivos relacionados à atração sexual. O que se sente à primeira vista. O que domina os sentidos, incita-os, excita-os. Aquilo se canta em canções sertanejas. O que é feito quando duas pessoas apenas fazem sexo, simplesmente transam por desejo e pelo desejo, mas há uma baixa classificação etária para
o horário ou sobra um alto nível de romantismo para os presentes na conversa, então, se diz “fazer amor”. O ato dos amantes. Romantismo entre pessoas apaixonadas, encantadas, fascinadas mutuamente, ou seja, escravas de sensações inefáveis que, por serem intraduzíveis, confundem-se com o verdadeiro e único amor. O amoR é um pilão cravejado de diamantes.

Amor: o verdadeiro. Puro e purificador. Assemelha-se a algo biológico, com laços de sangue. Nasce e cresce de repente, mas sobre uma base sólida de convicções. Não dá calafrios; esquenta mesmo. Não arrepia pelos ou cabelos; aquieta-os mansamente sobre a pele descansada e tranquila. Incrivelmente racional e desmedido ao mesmo tempo, mas não é contraditório. É lógico; deriva de ensaios de possibilidades analisadas e sentidas profundamente. Possui apego inquebrantável. Não morre com comportamentos espirrados de um dos amados. Cura-se sempre; na verdade, nunca morre. Pode seguir entristecido, mas segue. Natural e espontâneo. Simples e de uma alegria gulosa. É o laço entre pais e filhos, entre pessoas que se fazem de pais e filhos, que se escolhem como companheiros, amigos e cúmplices. Só se Ama quando o desejo, por sua vez, se manifestar timidamente e já sem forças. O Amor acontece à revelia da paixão, do encanto físico-químico. O Amor é a precisão e o carinho do ourives quando trabalha devoto no ouro mais puro jamais encontrado.

Objeto de amoR das mulheres: homens fortes, mais altos que elas, viris, condizentes com a maiúscula e masculina letra H. Esses são aptos para procriação, para proteção, para ação.  O primeiro filtro das escolhas não é eliminável. Acontece, queira a mulher ou não. Não há paixão que resista ao desinteresse dos sentidos. Se o que se vê, se ouve, se sente, se gosta e se cheira não agrada, espíritos cultos permanecerão ocultos da cobiça carnal feminina. Não corresponder a esse simples e decisivo método de eleição, para o homem, é certeza de um desejo malogrado e jamais correspondido.

Objeto de amoR dos homens: mulheres. O importante é espalhar seus genes. É da sua natureza.

Tendo tudo sido bem esclarecido, digo: não acredito no amoR. Essa entidade não existe. É apenas atração sexual. São os instintos que procuram, antes e acima de tudo, o belo, o simétrico, a aparência e, quando a obtém, brilham-se os olhos em falsas frases e juras de algo brejeiro. Quando leio poemas (e são tantos) que pincelam esse amoR como o verdadeiro entre os versos, percebo um tipo de auto-engano. Como uma OUTRA pessoa, até pouco tempo desconhecida, porém, agora desesperadamente desejada, poderá ser o ápice da SUA vida? Desejar o outro é, e sempre será, sinal de um simpático egoísmo. Se ele corresponder, fecha-se o ciclo e pronto. Cada um no egoísmo de um tesão tratado pela libido alheia. E isso é Amor? Nunca! Isso é amoR, algo que não passa de um eufemismo para uma forte e animalesca atração sexual irresistível.
Não se ama gemendo, gozando. Sacia-se o prazer, a vontade de entrar e se deixar invadir apenas. Esse amoR depende do externo, da aparência, de variáveis de peso, altura, linhas, formas e simetrias, todas calculadas instantaneamente por genes remanescentes dos neandertais. Dizem que o amor vai além do sexo, é mais que o sexo. Em tudo isso, o sexo está no meio. Então, é amoR.

Desse amoR nada sei, não conheço, nunca vi, jamais senti... Sim, conheço bem a falta que ele faz, pois somente se estabelece quando sofre reciprocidade. E não adianta me dizerem que quando eu menos esperar, o AmoR (esse é um híbrido, filho da pureza com a volúpia) acontece. Não. Chega-se a um momento na vida onde cada segundo contado despeja uma tonelada a mais de expectativas na carga sentimental. Não vivo pelo menos esperar. Tudo passou a ser urgente. Dose única e cavalar. Se não vem, o próximo segundo arria ainda mais o espírito alquebrado pela ausência da satisfação completa.

Quanto ao Amor, esse vale a pena. Acalma e alegra. Pavimenta uma longa e tortuosa estrada de solavancos sentimentais. É algo diferente de um sim ou de um compromisso nascido de uma pobre química orgânica mal evoluída. É outra essência. Envolve duas ou mais pessoas e atinge o máximo da abrangência universal quando se é encontrado logo ali do lado, tão próximo, tão junto de si: num filho, num sobrinho, num neto, num lanço de sangue ou caridade amorosa espontânea entre duas pessoas, sendo uma tão dependente da outra como a água depende da secura para ser percebida em seu valor inestimável.
Por exemplo, a surpresa e emoção de estar no quarto e seu sobrinho, recém sabendo andar, entrar e apontar para você, depois colocar as mãozinhas no peito e repetir o gesto duas, três vezes até ser compreendido que você mora lá, no coraçãozinho dele é algo que não posso classificar, senão, como Amor. Ou contar despretensiosamente para ele que há rumores de um monstro num lago lá na Escócia, e ele acreditar a ponto de sentir receio de ir ao banheiro, com medo do monstro surgir do sanitário, ou de ir à praia, é testar um sentimento de confiança e estima existente apenas no Amor. Saber, depois, que ele falou para avó que “se o tio falou então é verdade!” é de pensar sobre a forte influência que se tem na personalidade de um pequeno. Essa relação afetuosa e sincera é o que classifico como Amor. Somente isso é sincero na essência e pode ser maior que qualquer verdade, fé e desejo.
Acho que Deus vacilou feio quando pegou Adão pelo braço e lhe disse, apontando para Eva: osso dos seus ossos, sangue do seu sangue, abandonará pai e mãe e com ela serão um só corpo. Poético, porém, patético. Deus, ou quem se passou por ele na escrita do texto, estava visivelmente apaixonado, influenciado por um lirismo químico dos desejos carnais, que durou provavelmente menos que o tempo para cravar nas pedras esses versículos. Sangue e ossos de si mesmo APENAS os de si mesmo. Apenas os que se escolhe para si mesmo SEM conotação sexual. Se ao invés, tivesse dito tanto para Adão e Eva, apontando para Caim e Abel, que aqueles filhos eram os únicos dignos a receberem todo Amor do mundo, os únicos que realmente carregavam um laço sentimental seguro e sólido, talvez Abel tivesse respirado por mais tempo, fazendo com Caim uma dupla de irmãos e amigos.
E se tudo, no final, permanecer confuso com tantas definições sobre atração, sexo, amor, desejo e demais emoções/sentimentos que se vive, é porque se insiste em divinizar e embelezar o EU primitivo. Lembrem-se: antes de sermos cuidadosamente elaborados e esculpidos à imagem de um ente perfeito e celestial, somos animais. Algo acontece no nível mais recôndito e pouco compreendido de nossa mente e pronto, decidimos sentindo, não pensando.
E se tudo, num final ainda mais derradeiro, permanecer confuso quanto aos diversos amores e suas grafias, é porque, por uma questão de estética e significados linguísticos, escreve-se apenas amor. Ou Amor, como no começo das frases e dos ternos, vivazes e extremos sentimentos por alguém que nos põe um sorriso no rosto.

18 comentários:

  1. Variações do mesmo tema, a busca e o desejo.
    E hoje, a incapacidade dos homens em se amarem.
    Mas os corpos andam se entendendo...

    gostei bastante.

    abraços

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  2. Rob, o amor é aquele sentimento mais puro que nunca acaba, mesmo ferido regenera fica forte. Muito difícil encontrar esse amor, muitas pessoas se contentam com o amoR passageiro e envelhecem sozinhas - seria uma utopia, nesse mundo como está, o amor se apresentar derramado em pureza nos meros mortais. Hoje amamos os lugares, os livros, as histórias alheias, desmamando a criança interior e enfrentando a vida. Acredito que tudo seja um grande ensaio, ou alguma pregação de peça né?!
    Quem sabe não reescrevemos a bíblia.
    Abraços!

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  3. Lindo texto...

    Que pena hoje as pessoas tornaram tudo tão superficial, vivendo o amoR ao invés do Amor. E aqueles que ainda acreditam no Amor são consideras pessoas tolas, ingênuas. Espero que os que vivem esse amoR possam abrir seus olhos e enxergarem que existe muito mais do que toda ilusão sob a qual vivem.

    Beijo.

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  4. Gosto da maneira de como escreves..
    E por falar em amor, você teve uma otima desenvoltura com as palavras a respeito desse tema tão abrangente, e lindo.

    Um beijo.

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  5. Rob,
    Texto cru e signiicante, mais tantas são as faces dos sentimentos, principalmente a do amor.
    o amor romãntico, jamais deixará de ter o apêlo sexual e necessário, mas há o fator tempo, do qual transforma o amor-paixão (carne e primitivo) em amor-amor (alma e espiritual)
    Acredito na mutação de tudo que existe.
    Ficaria horas falando. Gosto do tema!
    Maravilhoso post!
    Bjão e boa semana pra ti, querido

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  6. Olá Rob!

    Me apaixonei pelo seu jeito de escrever.

    Nada romântico, nada melado.

    Nu e cru, como é a realidade do dia a dia.

    Parabéns pelo blog, parabéns pelo post.

    Bjo grande!

    Rosamaria

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  7. Passando e admirando...
    CriativO o título e instigante as palavras...

    B-Jos.

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  8. Prezado amigo;
    Um verdadeiro tratado, profundo, filosófico e poético sobre esse múltiplo e contraditório sentimento. Belo texto!
    Abç, ótimo final de semana!
    Adh

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  9. Muito bem escrito e maduro, sem pieguices e mostrando exatamente o que é o Amor.
    Minha admiração, caro Rob.

    Abraço,
    Jorge

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  10. Rob,

    o amor é mais fácil de ser encontrado. Herança do amor romântico.
    Já o Amor , entre o homem e a mulher, é raro. Apesar de calmo, assim o imagino, gera desejo, sim. Tem que existir desejo, respeito, amizade, admiração...
    Todos procuram o AMOR, poucos encontram. É preciso se dar sem medo e o medo, infelizmente, rodeia as relações atuais.

    Dizem que o verdadeiro e puro amor é o de mãe. Imbatível.

    Beijão

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  11. Humm...gostei disso, mas aguentaí que vou ler de novo com mais calma...tem muita coisa aí para eu processar...rsrs

    []s

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  12. Rob

    Vc é incrível nas palavras meu amigo,

    tem um poema seu chamado CONFESSIONÁRIO, que me arreipou, kkkkkkkkkkk tenho um com um mesmo título,

    kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk


    to viajando, volto somente dia 5 de janeiro

    Feliz tudo em sua vida e que possamos interagir mais e mais

    bjs meu amigo

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  13. Rob
    Passei para passear em meio a suas palavras e sentimentos que delas exalam. Adorei o texto e me identifiquei em tantos pontos. Quero agradecer pela parceria em 2010 no manual. Espero que continue em 2012.
    Feliz Ano Novo!
    Saúde e paz.
    bjs

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  14. Amor de pilão, Amor imortal, Amor jóia, Amor de Neandertal. Amor descrente, Amor de Adão, Amor de tio, Amor que é pouco para definir o Amor.
    Rob, se viver é crônico, o momento em que amamos alguém, seja qual for o amor, é a fase aguda dessa doença de existir.
    Tentei certa vez falar do amor. Fiz três crônicas (O Amor Eterno Dos Namorados/Os Namorados/O Amor É O Dom Supremo). Não sei se se recorda. Talvez, se eu tentar novamente, faça inda outra crônica, e outra...

    Rob, Feliz 2011 pra você. Que Deus esteja iluminando os seus caminhos e os dos seus.

    Deixo-lhe uma frase que tive muito prazer em cria-la, e espero que se veja nestas linhas, amigo:

    “Que o dom da escrita me sirva como arma contra o silêncio em vida, pois terei a morte inteira para silenciar um dia” (Jefhcardoso)


    Abraço fraterno do amigo Jefhcardoso!

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